Tata Tancredo da Silva Pinto: Um Pilar da Umbanda no Século XX
Tancredo da Silva Pinto (Cantagalo, 10 de agosto de 1904 — Rio de Janeiro, 1 de setembro de 1979) foi uma das figuras mais influentes da Umbanda e das tradições afro-brasileiras no século XX. Sua trajetória entrelaça-se com a luta pelo reconhecimento e respeito das religiões de matriz africana no Brasil, sendo ele um dos grandes articuladores de instituições que defendem a liberdade de culto e a dignidade das práticas espirituais afrodescendentes.
Raízes e Influências Familiares
Nascido em Cantagalo, interior do Rio de Janeiro, Tancredo era descendente de uma família profundamente envolvida com a cultura popular. Seu avô materno, Manoel Luiz de Miranda, foi um dos fundadores dos primeiros blocos carnavalescos da cidade, e sua tia Olga desfilava como a lendária Rainha Ginga, figura símbolo de resistência do antigo reino de Matamba. Essa convivência com expressões culturais afro-brasileiras moldou sua sensibilidade religiosa e sua vocação espiritual.
Militância Religiosa e Institucional
Na década de 1950, diante das constantes perseguições policiais e preconceito contra os cultos afro-brasileiros, Tancredo fundou a Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros, com o objetivo de dar personalidade jurídica e respeitabilidade aos terreiros e aos seus dirigentes. A partir dessa iniciativa, ele ajudou a fundar federações e organizações similares em vários estados, incluindo Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Pernambuco.
Seguindo uma orientação espiritual recebida em transe mediúnico — onde Xangô teria lhe ordenado a fundação de uma organização para proteger os umbandistas — Tancredo estruturou a Confederação Umbandista do Brasil, utilizando parte dos direitos autorais do samba “General da Banda”, gravado por Blecaute.
Umbanda e Cultura Popular
Tancredo também promoveu grandes eventos públicos para a valorização da Umbanda. Entre eles, destacam-se a Festa de Iemanjá no Rio de Janeiro, o evento “Você Sabe o que é Umbanda?” realizado no Estádio do Maracanã durante a gestão de Carlos Lacerda, e a Festa da Fusão dos Estados do Rio e da Guanabara, no centro da Ponte Rio-Niterói. Essas celebrações não apenas exaltavam as entidades espirituais, mas também afirmavam o direito à fé e à cultura afro-brasileira.
Escritor e Comunicador da Umbanda
Ao longo da vida, Tancredo escreveu mais de 30 obras literárias, sendo considerado um dos principais intelectuais umbandistas do século XX. Dentre seus livros, destacam-se:
- Doutrina e Ritual de Umbanda no Brasil (1951)
- As Mirongas de Umbanda (1954)
- Camba de Umbanda (1957)
- Cabala Umbandista (1970)
- Iaô (1975)
- Negro e Branco na Cultura Religiosa Afro-Brasileira (1976)
- Tecnologia Ocultista da Umbanda no Brasil (1972)
Além disso, manteve colunas em jornais cariocas, como o diário “O Dia”, disseminando conceitos, práticas e fundamentos da religião com clareza, orgulho e resistência.
Contribuições à Nação Omolocô
Tancredo também é uma figura central no fortalecimento da tradição Omolocô no Brasil. A cidade de Belo Horizonte consagrou o dia 10 de agosto à Nação Omolocô em sua homenagem. A bandeira da Nação Omolocô, enviada da Guiné por um Tatá Zambura, está exposta na Tenda Espírita Três Reis de Umbanda, no bairro do Cachambi (RJ), simbolizando a continuidade da missão espiritual recebida.
Legado e Despedida
Tancredo da Silva Pinto foi velado no Ilê de Umbanda Babá Oxalufã e sepultado no Cemitério do Caju. Segundo registros, mais de 3.566 filhos de santo foram iniciados por ele, sendo reconhecido como Tatá Ti Inquice e referência incontestável para sucessivas gerações de umbandistas. O Sirum (Axexê) — ritual fúnebre afro-brasileiro — foi conduzido por José Catarino da Costa, o Zé Crioulo, filho de Xapanã.
Seu legado permanece vivo nas instituições que fundou, nos livros que escreveu, e sobretudo na força espiritual daqueles que hoje continuam a luta pelo reconhecimento e respeito à Umbanda.
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